Por Charles Soares
É grande o empenho dos governantes e, na medida do possível, da mídia hegemônica para vender a imagem da cidade perfeita. O Rio olímpico, o Rio que irá brilhar nas lentes dos estrangeiros e estampar as páginas de notícias (esportivas) do resto do mundo.
O outro Rio, o que conhecemos e se espalha nas páginas de nossos jornais, vai bem, obrigado. Bem à margem das festividades olímpicas. Bem esquecido e abandonado em suas questões básicas como, aliás, sempre esteve. Com a rede de educação em greve, serviços de saúde precarizados e servidores de todas as áreas com salários atrasados, em nada se parece com o Rio do lado de lá.
O Rio olímpico, cartão postal, é o que estampa os outdoors, o que desfila nos comerciais de tevê, o que é cercado com painéis artísticos, na saída do aeroporto, para que a imagem do Rio pobre não possa invadir as retinas da família olímpica. Esse Rio contará com 136 ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e cerca de 2500 profissionais de saúde só para uso nos Jogos Olímpicos. Uma relação proporcional de causar inveja a países de primeiro mundo. Esse Rio contará com uma linha de metrô novinha exclusiva para si, enquanto o outro Rio desloca-se em trens sucateados e ônibus lotados ou, “não saiam de casa”, como sugeriu o prefeito. Esse Rio estará protegido pela força de segurança nacional, que é composta de homens que prestam serviço a um Rio, mas fazem parte de outro e, curiosamente se rebelam e fazem protesto por serem mal pagos e alojados em quartos vazios sem colchões ou qualquer estrutura.
Deve ser esse o legado que os jogos olímpicos deixarão para a cidade. Uma peça publicitária. Uma imagem impecável. Um Rio fictício para inglês ver. Mas há um Rio, entrincheirado, que se nega a aceitar esse legado.
É o Rio de verdade. O Rio que sempre existiu. Esse é muito grande para ficar atrás de uns tapumes, não dá pra se esconder debaixo do tapete. Ele se insurge e, contra a vontade do sistema, mostra a sua cara. E grita, e esbraveja, e protesta, e subverte a ordem. E os senhores do Rio olímpico lançam mão de suas armas ideológicas, lançam mão de sua polícia despreparada e mal paga e empreendem uma guerra de um lado só. Uma guerra em que só morrem pobres. Pobres e negros. Negros pobres. Pobres negros! Uns com fardas, outros sem fardas, mas do mesmo lado, do lado de lá dos tapumes, da senzala social que deve ficar em casa, vendo na tevê a festa da casa grande.
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